10 anos de Descodificação do Genoma: mitos e perspetivas futuras (3)

Este é o terceiro e último artigo da professora Manuela Grazina, da Faculdade de Medicina e Centro de Neurociências e […]

Este é o terceiro e último artigo da professora Manuela Grazina, da Faculdade de Medicina e Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra, sobre as implicações da descodificação do genoma humano:

O conhecimento das sequências do ADNn humano forneceu uma base importante para a compreensão da diversidade genética. Por outro lado, com a descodificação dos genomas de muitas outras espécies (112 vertebrados nos últimos 10 anos), que entretanto foram divulgados, ficámos também a conhecer a nossa árvore filogenética.

É inegável o grande impacto que surgiu em várias áreas científicas, desde a Evolução Humana e Antropologia, à Criminologia. Destaca-se a importância para a Medicina, tendo em conta a possibilidade agora muito superior de identificar um maior número de causas para doenças, tanto em doentes como em portadores, crucial no aconselhamento genético e no diagnóstico pré-natal ou pré-implantatório, bem como de desenvolver terapias genéticas ou de analisar variações genéticas que modifiquem a eficácia ou a toxicidade dos medicamentos, de tal forma que pode mesmo prevenir a morte em alguns casos, tendo em conta o exemplo do caso publicado no New England Journal of Medicine (2004), por Gasche e colaboradores, realçando a importância destes estudos.

Deste modo, também a Farmacogenómica e a Farmacogenética conheceram grandes avanços, embora a expetativa da prevenção total da toxicidade ou da dosagem personalizada de medicamentos ainda está longe de ser realidade, ao contrário do que se poderia pensar em 2003, conforme o artigo publicado no dia 24 de Outubro desse ano na Revista Science, pouco tempo depois da descodificação total do ADN humano.

No entanto, os avanços foram significativos nesta área em particular e, em 2013, já existem 106 fármacos no mercado com informação farmacogenética.

Ainda relativamente à relação da informação do ADN com a diferença na resposta/eficácia terapêutica, a descodificação do genoma humano irá permitir, num futuro próximo, identificar o porquê dos efeitos “placebo” e “nocebo”, relacionados com a “auto-cura” ou com a ausência dela ou doença induzida pelo próprio, respetivamente.

Mas as grandes descobertas só serão possíveis, com a integração de estudos de outras áreas, em adição à Genética, como a Bioquímica, a Imagiologia, a Biologia, a Neuroquímica, entre outras.

De acordo com os dados disponíveis na página do National Human Research Institute, nos últimos 10 anos foi possível identificar 4.847 mutações causadoras de doenças diferentes, tendo este número duplicado após a sequenciação total do genoma humano.

No Laboratório de que sou responsável (Laboratório de Bioquímica Genética do CNC, na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; Certificado de Qualidade ISO 9001:2008 (APCER) desde Julho de 2011), temo-nos dedicado desde há 18 anos à identificação das causas genéticas de doenças raras, localizadas em ambos os genomas, com particular interesse na interação bigenómica, que tem tido grandes desenvolvimentos graças à descodificação total dos dois genomas e aos avanços tecnológicos que acompanharam estas grandes descobertas.

Recentemente realizámos a caracterização farmacogenética, no âmbito de um Consórcio Internacional, de um dos genes que codifica uma enzima de metabolização de fármacos, que prevê que exista meio milhão de portugueses que têm um padrão de metabolização mais rápido do que o normal, e que podem ficar em risco se tomarem determinados medicamentos, realçando a importância dos estudos de farmacogenética nas populações.

Por outro lado, não nos podemos esquecer de que a formação de um ser humano não depende apenas da sua informação no ADN, mas também da forma como esta é lida, tendo ainda em conta as interações com o ambiente físico e social, que influenciam a sua tradução.

Um dos grandes problemas da atualidade consiste em perceber o significado de uma enorme quantidade de dados que é produzida diariamente em todo o mundo, ainda sem possibilidade de uma análise eficaz. Urge encontrar ferramentas bioinformáticas que permitam analisar tamanha quantidade de dados.

Tal como foi referido recentemente pela Prof. Eugénia Cunha, especialista em Evolução Humana, esta foi a década da «quantidade», almejando que a próxima seja dedicada à «qualidade».

E nós daremos certamente a nossa melhor contribuição.

 

 

 

 

 

 

Autora: Manuela Grazina
Faculdade de Medicina e Centro de Neurociências e Biologia Celular, Universidade de Coimbra

Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

 

Lista das publicações importantes em: http://www.ornl.gov/sci/techresources/Human_Genome/project/journals/journals.shtml

 

 

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