Tu estás bem é calado

O convite a José Sócrates – aceite por este – para protagonizar um espaço semanal de comentário na televisão pública […]

O convite a José Sócrates – aceite por este – para protagonizar um espaço semanal de comentário na televisão pública é editorialmente questionável e por isso sujeito às mais diversas opiniões, como sempre acontece com qualquer assunto. Só.

Aquilo a que assistimos desde a manhã desta quinta-feira é a um chorrilho de vulgaridades em torno da opção da direção de informação da RTP e do acordo firmado entre a estação e o antigo chefe de governo.

Portugal está esquizofrénico. Em poucas horas, dezenas de milhar de portugueses assinaram as petições entretanto criadas para impedir a pessoa em causa de usar de um dos mais importantes direitos de um regime democrático: a liberdade de expressão.

Infelizmente, continua a faltar-nos a mesma mobilização para causas verdadeiramente essenciais.

Permitir que Sócrates tenha opinião e a torne pública não significa sanear a sua responsabilidade na situação do país.

Aos tribunais e não ao espaço público deve caber (ou deveria, se as instituições funcionassem) a missão de julgar eventuais responsabilidades criminais deste, como de qualquer outro responsável político, no exercício de funções públicas.

A liberdade de expressão que tantas vezes – e justamente – apregoamos não pode servir apenas a conveniência.

A garantia constitucional que permite a Passos Coelho dizer que o desemprego é uma oportunidade é a mesma que há-de servir a José Sócrates para tentar escamotear a sua implicação direta na desgraça a que coletivamente chegámos. Haverá quem concorde com o que vai ser dito. Outros discordarão. Podemos não gostar, achar errado, até um grande disparate. Eu, pessoalmente, acho um descaramento.

Em muitas coisas continuamos um povo atrasado, ainda preso às amarras de uma falsa moral opressora.

Uma frase acompanhou-me ao longo do dia: “está caladinho ou levas” e no fundo é isto. Em cada um de nós mora um pequeno ditador que quer um mundo pintado apenas com as cores que mais lhe agradam.

É também por isso que chegámos a este ponto.

 

Autor: Nuno Andrade Ferreira, jornalista

 

 

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