Venha revisitar a cidade de Portimão em 1941

A 28 de Maio de 1941 o diário lisboeta “A Voz” consagrou um número especial a Portimão, que designou como […]

A 28 de Maio de 1941 o diário lisboeta “A Voz” consagrou um número especial a Portimão, que designou como “florescente e laboriosa cidade”.

O periódico, de inspiração cristã e fiel aos ideais do Estado Novo, dedicou algumas páginas à urbe barlaventina, cuja análise permite caracterizar a cidade e a sociedade de então.

Portimão emergia aos olhos do visitante de uma forma deslumbrante: “Situada sobre uma pequena elevação de terreno na margem direita do Arade, a dois quilómetros da barra, a cidade de Portimão, com o seu casario muito branco reflectindo-se nas águas do rio, coalhado de embarcações, em permanente vaivém, emoldurada pela verdura dos seus campos bem cultivados e tendo ao fundo a mancha azulada da Serra de Monchique, tudo banhado pela clara luz meridional, oferece um panorama encantador para todos aqueles que a visitam”.

A cidade e o concelho afirmavam-se no contexto regional, com um comércio desenvolvido e uma intensa atividade pesqueira, associada à preponderante indústria conserveira, e também a um ativo tráfego comercial portuário.

Em 1939, do total de 26 278 toneladas de pelágicas (atum, cavala, sardinha, carapau e corvina) capturadas nos portos do Sul, couberam a Portimão 11 752 t.

Da totalidade do peixe, moluscos e crustáceos, que somou 31 119 t, pertenceram a Portimão 12 086 t. Só a sardinha representou 9 334 t contra 4 283 em Olhão.

Quanto ao movimento marítimo, também em 1939, entraram no porto de Portimão 302 navios com 193 744 t, 204 dos quais com propulsão mecânica.

A estatística dos restantes portos algarvios demonstra inequivocamente o dinamismo da novel cidade barlaventina. No porto de Lagos, no mesmo ano, entraram 50 navios, com 39 068 t, em Faro-Olhão 140, com 20 257 t e por fim Vila Real 210, com 175 286 t.

A nível nacional, o porto de Portimão ocupava também uma posição cimeira, o quarto lugar. Já no ano seguinte registou o segundo maior rendimento a nível nacional, só suplantado por Matosinhos.

Se em 1939 o valor do pescado vendido se cifrou em 13 595 contos, em 1940 atingiu 23 254 contos. A cidade detinha 22 fábricas de conservas, que ocupavam 4 000 operários de ambos os sexos. O peixe era pescado por dezassete cercos e traineiras, que empregava cerca de 1 200 homens.

Mas nem só da pesca e das conservas viviam os portimonenses: “ainda tem Portimão a preparação e exploração dos frutos secos, e as pequenas indústrias caseiras em que se ocupam muitas mulheres. De entre as principais, são o doce e a obra de palma. Esta última fornece as esteiras regionais (capachos) e as embalagens para o figo e amêndoa, desde as golpelhas e as ceiras usuais, até aos cabazes e alcofinhas para as embalagens de luxo.”

Acrescente-se ainda as “importantes marinhas que fornecem sal de muito boa qualidade”.

Se todas estas atividades originavam um intenso tráfego no porto de Portimão, havia ainda a acrescentar os produtos oriundos de outros concelhos, como Lagoa, Monchique e especialmente “as elevadas produções das fábricas de cortiça de Silves”.

Por sua vez e também por via marítima chegavam à cidade diversos produtos importados, tais como, “folha, estanho, chumbo, máquinas, azeite, palma, etc.”

Mas o intenso movimento no porto encontrava-se condicionado face às suas difíceis condições de navegabilidade. O acesso exterior achava-se impedido “por uma barra com uma disposição natural desfavorável” e identicamente o seu interior estava “muito obstruído por grandes bancos de areia”.

As delicadas condições de navegabilidade não eram recentes e remontavam mesmo a 1815. Apesar de diversas intervenções realizadas até 1941, os resultados nem sempre foram satisfatórios, pelo que urgia uma nova e profunda intervenção.

Porém, apesar de à época já existir um projeto aprovado para as obras da barra e porto de Portimão, estas demoravam em iniciar-se, pelo que, “A Voz” considerava ser a sua execução a aspiração número um dos portimonenses.

Mas outras aspirações existiam, tais como o turismo, ou não reunisse o barlavento algarvio “três dos maiores atractivos desta província: Praia da Rocha – Sagres- Caldas de Monchique.”

Porém e como reconhecia o jornalista, “o turismo, apesar das condições especiais que esta região reúne para o efeito, está longe ainda de ter a organização que o transforme numa indústria como outra qualquer, e para o que são necessários capitais e melhoramentos. Sem estas duas coisas – que se dizem facilmente mas que são duma dificuldade incomensurável – não é possível valorizar como merece, a Praia da Rocha”.

Mesmo assim, esta era já, naqueles anos, passagem obrigatória para quem demandasse a terras algarvias: “toda a gente que desce até ao Algarve vem à Praia da Rocha, situada junto a Portimão, a uma distância que se percorre a pé, ou no transporte regional «carrinha» a 1$00 por passageiro.”

Esta zona balnear era considerada “a praia portuguesa mais pitoresca pela configuração dos seus rochedos e pelo ambiente meio urbanizado – meio campesino que a envolve”, além de que “é de areia fina, sem declive e duma segurança tal que dispensa banheiro. É uma praia ideal para crianças”.

Passada a época balnear eram os estrangeiros que a procuravam, “que na sua maioria ali se fixam aguardando os meses mais temperados para voltar, como aves migradoras, aos seus países do Norte”.

Apesar das condições de apoio aos turistas serem razoáveis, dado que dispunha de “abundância de água potável canalizada” e de vários “hotéis que são os melhores desta província, pensões e inúmeras vivendas mobiladas para todos os preços”, a Praia da Rocha carecia de diversos melhoramentos.

À data da reportagem encontrava-se em execução um plano de atividade turística, o qual consistia na “construção do primeiro troço da Avenida Marginal; idem de marcos fontenários e W.C.; idem duma «passerelle» sobre o rochedo dos «Castelos», idem dum miradouro na Fortaleza de Santa Catarina; idem dum balneário junto da praia”.

Mas se as obras no porto marítimo e o incremento do turismo constituíam as grandes aspirações dos portimonenses, outras existiam, tais como “a construção dos edifícios escolares, do tribunal e da cadeia, casa para residência dos magistrados (…), a electrificação da Central das Águas na Figueira, electrificação das freguesias rurais e reparação de ruas”.

(Continua)

Texto de: Aurélio Nuno Cabrita

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