Plataforma Algarve Livre de Petróleo manifesta «incredulidade e revolta» por decisão da APA

A Plataforma Algarve Livre de Petróleo (PALP) manifestou hoje, em comunicado, a sua «incredulidade e revolta perante a decisão da […]

A Plataforma Algarve Livre de Petróleo (PALP) manifestou hoje, em comunicado, a sua «incredulidade e revolta perante a decisão da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) de não sujeitar furo de Aljezur a Avaliação de Impacte Ambiental (AIA)».

No seu comunicado, a Plataforma, que junta associações ambientalistas, movimentos de cidadãos e empresas, classifica como «vergonhosa e injustificada» a decisão da APA, de não sujeitar a Avaliação de Impacte Ambiental para realizar o furo de prospeção de petróleo da ENI/Galp, no mar e 46 quilómetros ao largo de Aljezur, que pode ir até 3 quilómetros de profundidade no subsolo marinho.

Esta decisão foi emitida, «apesar da consulta pública que terminou no passado dia 16 de Abril, em que alguns milhares de pessoas se manifestaram a favor de que aquela fosse realizada», salienta a PALP.

Naquilo que considera como uma «demonstração da já costumeira falta de transparência», a APA refere, «no parecer justificativo desta decisão, que pediu pareceres a 9 entidades governamentais, de entre as quais algumas responsáveis pela manutenção e gestão do bom estado ambiental do país, mas não refere o teor desses pareceres».

Por isso, a PALP exige «o acesso a esses pareceres».

E a Plataforma interroga: «será possível as entidades governamentais continuarem a ignorar as repetidas contestações e perguntas dos cidadãos, alegando um “interesse público” que de público nada tem?»

A PALP acrescenta que o Governo português «exercendo um poder discricionário, que tem favorecido claramente os interesses do consórcio explorador ENI/Galp», põe «em risco os interesses da região e das populações» e ontem demonstrou que «é conivente com as petrolíferas e escolhe defender o interesse privado em detrimento do público, numa demonstração clara de conluio».

Cronologia de uma luta:

Julho de 2016 – Comunidade Intermunicipal do Algarve submeteu uma providência cautelar em defesa da região.

Setembro de 2016 – Vídeo da Ministra do Mar a promover a venda de novas concessões para a exploração de petróleo e gás, contrárias aos acordos internacionais assinados pelo Governo para a redução de gases de efeito de estufa, diretamente ligados aos combustíveis fósseis, petróleo, carvão e gás (ver vídeo aqui: https://www.youtube.com/watch?v=5p9YaOvrVa8).

11 de Janeiro de 2017 – apesar das 42000 objecções apresentadas pelos cidadãos a esta mesma sondagem ao largo de Aljezur, o governo emitiu um TUPEM para que a concessionária ENI/Galp possa perfurar no mar para prospeção de petróleo e gás.

Maio de 2017 – Câmara Municipal de Odemira submeteu uma providência cautelar e é aceite pelo tribunal.

Abril de 2017 – Câmara Municipal de Odemira viu o efeito suspensivo da sua providência cautelar ser levantado pelos Ministérios da Economia e do Mar, que evocaram a licença que o próprio Governo emitiu.

Maio de 2017 – A PALP submeteu uma providência cautelar com o apoio do dinheiro angariado numa campanha.

Junho de 2017 – Os Ministérios da Economia e do Mar emitem uma Resolução Fundamentada (artigo 128º-1 do CPTA) para levantar o efeito suspensivo da providência cautelar submetida pela PALP tendo em conta o «interesse público» do trabalho das concessionárias ENI/Galp.

Outubro de 2017 – O Secretário de Estado da Energia prorroga os contratos evocando a licença TUPEM e a não aceitação das providências cautelares (que na verdade ainda estão em procedimentos judiciais). Assim a Resolução Fundamentada, que não era de conhecimento público, serviu entretanto como desculpa para a prorrogação dos contratos, (que de outro modo terminariam) evocando um ‘interesse público’.

Março de 2018 – A existência da Resolução Fundamentada é dada a conhecer num documento emitido pela concessionária. A PALP exige a divulgação da Resolução Fundamentada e informa o tribunal.

Atualmente – Os procedimentos da providência cautelar da PALP continuam no tribunal de Loulé

A Plataforma acrescenta que, na decisão da APA, «estão ocultados factos referidos nas respostas dos cidadãos e/ou das organizações». Por exemplo, «não é referida a informação de a localização da zona da sondagem ser sobreposta à zona de distribuição de coral vermelho (Corallium rubrum; Linnaeus, 1758), como descrito por Boavida et al. (2016)2, não é mencionada a presença de uma espécie rara e vulnerável na nossa costa e listada em duas convenções internacionais (Convenção de Berna e Diretiva Habitats da Rede Natura 2000) e não é desenvolvida também a questão da proposta de extensão do Sítio de Importância Comunitária (SIC) da Costa Sudoeste fundamentado por trabalhos científicos decorrentes do Projeto Life MARPRO2».

Por isso, salienta a PALP, «não compreendemos como tais factos, de entre tantos enumerados nas respostas enviadas à Consulta Pública, são deliberadamente omitidos, assim como não compreende como pode a APA afirmar que “as considerações expressas em sede de consulta pública dizem respeito sobretudo à exploração de hidrocarbonetos”, quando houve centenas – se não milhares – de respostas que se focaram unicamente nos impactes da prospeção».

A Plataforma diz não entender ainda «como é que, reconhecendo a APA que “a totalidade dos pareceres manifestam-se a favor de um procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental do projeto em análise”, e sendo a APA um organismo governamental que deve defender o ambiente e representar os cidadãos, a decisão é pela não sujeição a AIA».

A APA, recorda a Plataforma, entende que «faace ao exposto, conclui-se que o projeto não é suscetível de provocar impactes negativos significativos, pelo que, nos termos da lei, não carece de Avaliação de Impacte Ambiental».

A PALP manifesta a sua «surpresa» perante o que classifica como «justificação circular e dogmática», em que se conclui que «não há impactes negativos antes de ser avaliarem os mesmos, especialmente quando, nas respostas à Consulta, foram enviados tantos e tantos estudos que referem que, mesmo a fase de prospeção, tem impactes negativos e permanentes no meio ambiente».

Ou seja, sublinham, «toda a informação que argumentava a favor da realização de AIA foi consecutiva e persistentemente ignorada e descartada».

As entidades que compõem a PALP relembram que o desrespeito pela opinião divergente «não é de agora: apesar das 42000 objeções apresentadas pelos cidadãos em Consulta Pública a esta sondagem ao largo de Aljezur, o Governo emitiu um Título de exploração (TUPEM) de petróleo e/ou gás numa região de elevado risco sísmico, epicentro dos dois maiores sismos do País».

Apesar de a Comunidade Intermunicipal do Algarve, a AMAL, ter interposto uma providência cautelar em defesa da região, «esta viu o efeito suspensivo de quaisquer trabalhos ser levantado pelos Ministérios do Mar e da Economia, evocando a licença que o próprio Governo emitiu como fundamento para essa decisão (Resolução Fundamentada artigo 128º-1 do CPTA)».

Uma segunda providência cautelar interposta pela Câmara Municipal de Odemira «viu igualmente o seu efeito suspensivo levantado, sendo os trabalhos na zona novamente autorizados, sem nenhuma justificação plausível que demonstre verdadeiramente “interesse público” na continuação dos trabalhos».

A terceira providência cautelar, da PALP, e que veio questionar a emissão do título de utilização do espaço marítimo (TUPEM), «viu igualmente o seu efeito suspensivo levantado pelos Ministérios do Mar e da Economia (Ministério do Mar, que tem vindo a promover a venda de novas concessões para a exploração de petróleo e gás, contrárias aos acordos internacionais assinados pelo governo para a redução de gases de efeito de estufa, diretamente ligados aos combustíveis fósseis, petróleo, carvão e gás)».

E, sublinha a PALP, «os levantamentos dos efeitos das providências cautelares não estão sujeitos à aprovação de um juiz».

Por isso, a Plataforma pergunta: «como pode o Governo decidir em situações em que é a entidade a ser “julgada”?»

É que, defende, «uma vez que decorrem ainda em tribunal alguns destes processos de contestação – não tendo ainda nenhum deles sido ouvido em audiência – este poderá tornar-se num dos maiores atropelos à democracia que temos vindo a assistir!»

Os trabalhos assim permitidos por esses levantamentos «serviram, entretanto, como justificação para a prorrogação dos contratos (que de outro modo terminariam), assim como as quantias que as empresas tinham investido».

E a Plataforma pergunta: «que interesse tem o público numa atividade que coloca em risco todas as atividades da região e a sua própria existência, no que a define e caracteriza? E quando, pelo contrário, o que se verifica em todas estas ações executivas é a defesa consistente dos interesses da entidade exploradora, acima dos interesses da população, e acima dos riscos que esta atividade implica?».

Por fim, sublinha a Plataforma, «a lei permite que esses riscos e impactes sejam avaliados e obriga inclusivamente a avaliação quando os projetos são suscttíveis de provocar um impacte significativo no ambiente», mas eis que «a APA vem novamente e ainda questionar o público se há ou não necessidade dessa avaliação, apesar de já o ter feito e de ter obtido 42000 objeções a esta mesma operação. Tudo apenas para esta semana vir a público ignorar essas mesmas objeções e anunciar que afinal nem sequer é necessária haver uma AIA».

«Como se tudo isto não fosse mais do que suficiente, temos ainda a questão das alterações climáticas e a necessidade imperiosa, reconhecida pela comunidade científica internacional, de manter o aquecimento global (pelo menos!) abaixo dos 2ºC, como decidido no Acordo de Paris, que Portugal ratificou».

Ora, «para isto acontecer, é necessário que cerca de 80% de todas as reservas já conhecidas de petróleo, gás e carvão não sejam utilizadas».

No entanto, «o que o consórcio Galp/ENI pretende fazer na costa alentejana é procurar mais reservas impossíveis de queimar, isto numa altura em que o Governo português anunciou um compromisso para Portugal ser neutro em emissões de carbono em 2050, e está em decurso um estudo extensivo para perceber como melhor concretizar esse objetivo».

De acordo com a APA, a entidade exploradora poderá a partir de 15 de Setembro até 15 de Janeiro de 2019 iniciar os trabalhos de sondagem, apenas sendo necessário avisar o Governo com 15 dias de antecedência.

O navio designado para esta operação «Saipem 12000» está neste momento ao largo da ilha de Las Palmas, nas Canárias, portanto a curta distância do local de sondagem.

A terminar o seu longo comunicado, a Plataforma Algarve Livre de Petróleo recorda que «foi na fase de sondagem que ocorreram, entre outros, os enormes derrames do Golfo do México na plataforma Deepwater Horizon, cujos efeitos devastadores subsistem há anos, com perda graves para as comunidades de peixes, aves e emigração da população e abandono da região».

Por isso, sublinha a PALP, «é por demais óbvio que terão de ser os cidadãos a exigir o cumprimento dos seus direitos e o cumprimento da lei na defesa dos seus próprios interesses, para que o Governo entenda o significado de interesse público, ao abrigo da constituição portuguesa, contrário à concessão do mar para interesses privados».

A PALP anuncia, a concluir, que continuará a trabalhar «com o objetivo de encerrar este capítulo da exploração de hidrocarbonetos em Portugal (anular todos os contratos em vigor e impedir novos contratos!)» e pede «a todos os cidadãos que se manifestem, que se mostrem contra e que defendam o património ambiental, social, económico e cultural português».

Neste sentido, hoje, pelas 16h30, há uma manifestação contra a exploração de petróleo no Algarve, marcada para junto da Câmara Municipal de Aljezur e aberta a quem quiser participar.

 

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