Candidatos a reitor da UAlg à lupa: Saúl Neves de Jesus

O novo reitor da Universidade do Algarve será escolhido na próxima quarta-feira, dia 15 de Novembro – ou no dia […]

O novo reitor da Universidade do Algarve será escolhido na próxima quarta-feira, dia 15 de Novembro – ou no dia 16, caso nenhum dos candidatos obtenha 18 votos na primeira votação. Ao cargo, candidataram-se três professores da instituição: Saúl de Jesus, Paulo Águas e Efigénio Rebelo.

O Sul Informação e a Rádio Universitária do Algarve RUA FM entrevistaram os três candidatos a reitor da UAlg. A cada um deles foram colocadas as mesmas quatro questões e dados 20 minutos para lhes responder.

Ao longo desta sexta-feira, o Sul Informação revela o que pensa cada um dos aspirantes a ocupar a cadeira de reitor da UAlg e as suas ideias para a instituição. As entrevistas serão publicadas pela ordem em que serão realizadas as Audições Públicas aos candidatos, na terça-feira, dia 14 de Novembro, às 9h30, 13h30 e 17h30.

Aqui, fica a conversa com Saúl Neves de Jesus, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade do Algarve.

Porque se candidata a reitor?

Eu já  fui candidato a reitor da Universidade do Algarve há 12 anos. Na altura, já era Professor Catedrático, algo que era um dos requisitos para se poder ser candidato. Com o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), que enquadra toda a dinâmica do Ensino Superior, começou a ser possível que professores não catedráticos ou que não estivessem no topo da carreira se pudessem candidatar. Há outros candidatos que não se enquadram naquilo que eram as regras, no passado.

O que é certo é que estes 12 anos foram anos de experiência acumulada. Foram anos em que desempenhei funções de diretor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (FCHS), presidente Conselho Científico da mesma faculdade – até à semana passada – e sou presidente de um centro de investigação avaliado com Muito Bom pela FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, além de outras funções, até externas, do ponto de vista da experiência de gestão, que me permitem surgir agora como um candidato melhor preparado, com mais maturidade, experiência acumulada e provas dadas.

Por outro lado, acho que estou numa fase da minha vida – tenho 52 anos – em que ainda concílio a energia, a capacidade de resposta, com essa tal experiência que eu julgo que é necessária para assumir os desígnios da Universidade do Algarve.

 

O que propõe para a Universidade do Algarve?

É difícil resumir em poucas palavras aquilo que se pode fazer por uma instituição com o potencial que a Universidade do Algarve tem. O meu programa de ação está organizado em quatro grandes dimensões, as mesmas que caraterizam a dinâmica da vida universitária: o ensino, a investigação, a extensão e a governança. Para cada uma dessas vertentes, tenho objetivos e propostas de ação que poderão permitir concretizá-los.

Na vertente de ensino, eu destacaria a importância de nos aproximarmos cada vez mais da região.

Há a questão da internacionalização, na qual eu penso que é fundamental continuarmos a apostar, até porque temos aumentado o número de alunos estrangeiros. Ainda assim, temos ainda uma folga do ponto de vista da percentagem de alunos que podemos integrar nos nossos cursos que nos leva a considerar que é fulcral continuar a apostar na internacionalização. Até porque ela está, também, ligada à investigação.

Mas eu penso que teremos, também, de voltar a pensar cada vez mais no Algarve e nos alunos da região. Temos cursos que não têm tido muita procura, quando há jovens algarvios que os vão procurar noutras universidades. Isso passa muito pelo prestígio dos nossos cursos, da imagem que há sobre a qualidade daquilo que oferecemos. É fundamental criar laços com a região que permitam a que os alunos, os pais e os professores voltem a ter confiança na nossa instituição.

Daí, uma das propostas é a criação de um Conselho Consultivo em que os diretores de escolas e representantes dos pais possam estar presentes, para além de uma série de outras medidas. Entre elas, destacaria a criação de uma plataforma de treino de soft skills, de forma a que, no final de cada semestre, os alunos, independentemente do curso que frequentam, possam desenvolver determinada competência.

Há um período de paragem em que não há aulas nem avaliações e os estudantes poderão desenvolver competências de métodos de estudo, de gestão do tempo, de comunicação, entre outras, escolhida por eles. Quero que isso passe a ser uma marca da identidade, da especificidade da UAlg. Será quase um selo de garantia de qualidade, até para potenciais empregadores.

A componente de investigação, por seu lado, é algo muito  importante. Como presidente de um centro de investigação e até pelo meu currículo, é algo que valorizo. Temos de ter, cada vez mais, propostas formativas com investigação associada, que permita reconhecer a qualidade dessas propostas, até do ponto de vista dos nossos cursos.

Nesse campo, vamos ter já nos próximos meses  a avaliação dos nossos centros de investigação. Assim, é fundamental que os nossos centros sejam bem avaliados e que façamos um esforço nesse sentido. Depois, haverá um período de quatro ou cinco anos em que os centros, com a classificação que tiverem, poderão acolher novos investigadores.

Eu gostaria que os professores da UAlg que não fazem ainda parte de centros de investigação, em particular os do subsistema politécnico, possam ter a oportunidade de neles serem integrados, logo depois da avaliação. Isso passa pela autonomia dos centros de investigação, teriam de aceitar, mas a reitoria teria aqui um papel de mediador, no sentido de sensibilizar os centros para acolherem colegas que poderão não ter ainda o nível de investigação desejado, mas que, associados a equipas de investigação, podem começar a produzir, quer publicações, quer projetos de investigação financiados.

Mas terá de haver contrapartidas. Até pode haver a possibilidade daqueles que mais investiguem possam vir a ter uma folga no serviço docente. Portanto, valorizar objetivamente a investigação, havendo uma focalização dos bons investigadores nesta área e maior disponibilidade nas tarefas de ensino, entre outras. Mas isto terá de passar pelo alcançar de objetivos.

Na vertente da extensão, tem muito a ver com a aproximação à região: conseguir chegar junto da comunidade que nos envolve, das instituições públicas e privadas.

Ao nível da governança, há uma série de medidas que poderão ser implementadas, para captação de receita. Mas há, sobretudo, a necessidade de rever os estatutos da universidade, algo fundamental. Mas teremos, também do ponto de vista transversal, de rever os regulamentos, as normas e as regras da instituição.

A minha política em relação a tudo o que são regulamentos é a de mexer o mínimo possível, no sentido de possibilitar que estes, bem como as normas e as regras, sejam simplificados e que não compliquem, mas que se norteiem por aquilo que é legalmente exigido. A ideia é diminuir a burocracia e simplificar a vida das pessoas. Porque uma das coisas que é importante é ter foco, saber para onde queremos ir e não andar dispersos com a obrigação de preencher papéis e plataformas informáticas, que é algo que eu sinto que está a acontecer na UAlg  e que temos que ultrapassar.

Ainda na mesma vertente, também quero frisar a importância de uma cultura organizacional como um todo. Eu penso que temos de levar a bandeira da Universidade do Algarve. Os colegas têm cada vez mais de valorizar a universidade como o aspeto principal e não tanto o facto de ser da Unidade Orgânica X ou Y. Essa identidade também é importante, mas a UAlg vem primeiro, bem como tentarmos convergir nos projetos de desenvolvimento da instituição, para a ajudar a crescer, independentemente da  unidade orgânica de que façamos parte.

Propõe mudanças a nível da estrutura orgânica e da gestão?

No que diz respeito a mudanças, o meu posicionamento é o de que não devemos mudar por mudar. Só o devemos fazer quando temos a certeza que é para melhor. Há aquelas alterações que são mais ou menos pacíficas e consensuais, porque já houve uma reflexão, uma maturidade na instituição, que leva a que isso aconteça. Um exemplo é o Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina passar a Faculdade. Penso que é mais ou  menos pacífico. Isso passa pela revisão dos estatutos da universidade, que deverão explanar desde logo essa alteração.

Já no que diz respeito à estrutura, não vislumbro alterações. Penso que devemos partir do que temos. Os docentes estão enquadrados em Unidades Orgânicas, dentro de algumas delas há departamentos, que também funcionam bem. Há uma dinâmica de trabalho de acordo com as áreas científicas e com os cursos em que lecionam.

Penso que é daí que devemos partir, porque mudanças estruturais envolvem perdas de tempo. Ou bem que era algo claramente necessário e em que havia consenso, ou acho que não vale a pena estar a mexer.

O que devemos é valorizar mais o Campus de Portimão. Este é um polo que nós temos que nos permite essa integração no Barlavento Algarvio e que tem apenas dois cursos a funcionar. Penso que se poderia potenciar mais o nosso trabalho lá. Podemos, inclusivamente, ter aulas em vídeo-conferência, aproveitando as novas tecnologias, bem como oferecer formação pós-graduada, para que este Campus fosse melhor aproveitado.

Tudo isto tem a ver com gestão: financeira e de recursos humanos. A gestão financeira é fundamental, até pela situação financeira em que a UAlg se encontra, que, como é do conhecimento público, não é famosa.

A Universidade do Algarve teve um ciclo de alguma recessão, como as demais Instituições de Ensino Superior, há alguns anos. Nos últimos dois anos, penso que esse ciclo começou a ser travado. Agora, há que invertê-lo, de fazer que as coisas comecem a ser alterados ao nível da captação de investimento.

Há bons indicadores nesse sentido. No ano passado e há dois anos, conseguimos um número de ingressos de alunos superior aos dos anos anteriores. Também ao nível da captação de projetos, conseguimos no último ano um volume de receita interessante, através dos projetos de investigação.

Nas atividades de prestação de serviços, tem havido uma quebra. Aí, é importante ver o que se passa e promover a tal aproximação, sobretudo à região, necessária para que nos prefiram a nós em relação a outras instituições.

Um exemplo muito concreto, relacionado com o ensino e com a ligação à região, são os agrupamentos TEIP – Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, que não é propriamente uma grande fonte de financiamento, mas que é algo que nos permitirá a ligação com as escolas do ensino básico e secundário, que eu considero importante, para que os alunos comecem, desde logo, a ficar sensibilizados em relação à Universidade do Algarve.

O que acontece em relação a isso é que havia há quatro ou cinco anos um grupo de agrupamentos TEIP que tinham consultores da Universidade do Algarve e, agora, escolheram consultores de outras instituições, como o ISCTE. Era necessário retomar a confiança das escolas, das instituições e empresas, para que, também ao nível da prestação de serviços, pudéssemos captar mais receitas.

Do que tem sido feito nos últimos anos, ao que é que daria continuidade e ao que é que não daria?

Como já tinha referido, eu acho que quando mudamos tem de ser para melhor. Não sou pessoa de ruturas, tento sempre aproveitar o que está bem feito, sou otismista e tento valorizar os aspetos positivos, até por uma questão de feitio. Portanto, é esse o meu posicionamento em relação a esta questão.

Há aqui uma gestão que não foi fácil, da parte do professor António Branco, do ponto de vista da margem financeira. Não irei, propriamente, dar continuidade, pois cada um tem o seu estilo, as suas próprias dinâmicas, mas irei tentar aproveitar o que foi feito do ponto de vista da comunicação.

Neste campo e até no que diz respeito à informação interna, a UAlg tem vindo a funcionar bem. As pessoas estão envolvidas, tem havido uma aproximação entre os subsistemas politécnico e universitário, que é de preservar e acentuar, na perspetiva de uma cultura organizacional da universidade como um todo.

Onde eu tentaria incutir uma dinâmica maior, o que poderá também ser uma valência que nos permitirá gerar mais receitas, é ao nível da investigação. Dar alguma folga aos bons investigadores e haver um reconhecimento explícito e objetivo dos mesmos, para que possam dedicar-se mais a essa valência da vida académica. E, ao mesmo tempo, para que outros possam sentir que vale, de facto, a pena apostar na investigação e comecem a ter essa dinâmica.

Há ainda as atividades de extensão. As pessoas que conseguem ter uma ligação à comunidade, ao exterior, às empresas e que, através da consultadoria e outras, geram retorno para a instituição, também deverão ter algum reconhecimento e alguma folga no que às tarefas de ensino diz respeito.

Ao nível do ensino, há uma questão que me preocupa há muito, a do abandono dos alunos. Nós estamos com percentagens de abandono da ordem dos 13%, o que é muito. Isso é algo que me deixa preocupado, até pela minha formação na área da psicologia e das ciências da educação, o que me torna sensível em relação a estas matérias.

A UAlg tem de fazer algo para combater isto. A plataforma de desenvolvimento de competências no estudante poderá, também, dar um contributo, ao nível dos métodos de estudo. Porque os alunos, quanto mais sucesso tiverem no seu curso, mais integrados e motivados se sentirão para continuar.

Por outro lado, há também que apostar na formação pedagógica dos professores, para aumentar o sucesso e a motivação no espaço académico, quer de docentes, quer de alunos. É importante que os próprios professores façam um balanço positivo da sua atuação e estejam motivados.

No que diz respeito aos ingressos, devemos, cada vez mais, tentar preencher as vagas dos cursos, pois ainda há uma folga muito grande. Temos subido nos últimos dois anos, mas há uma situação a que devemos ter atenção, que é o facto de estarmos a subir menos que os outros.

Houve uma crise no Ensino Superior ao nível da captação de alunos e todas as instituições se ressentiram. Estamos a recuperar, mas a UAlg está a recuperar menos que outras. Portanto, temos de continuar a intervir no sentido de termos propostas formativas que vão ao encontro da procura e saber cativar os alunos para os nossos cursos.

Não obstante as preocupações financeiras serem grandes, eu considero que a nossa aposta deve ser, fundamentalmente, nas pessoas. A Universidade é constituída por pessoas – professores, funcionários não docentes e alunos – e elas podem criar riqueza.

Não vale a pena falar só de números. Temos de os referir, mas também temos de ter de forma muito clara a visão de que eles  só existem porque há quem possa levar a que isso aconteça e que essa riqueza seja construída.

Toda a minha sensibilidade, que resulta da minha formação e do meu percurso passado, vai no sentido de uma gestão próxima das pessoas. Ouvir e definir as estratégias em conjunto e de forma participada com os colegas, com os funcionários e com os alunos. É dessa forma que eu penso atuar.

 

Leia também as entrevistas a Efigénio Rebelo e a Paulo Águas.

As três entrevistas podem ser ouvidas, na íntegra, aqui.

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