Raio X dos Concelhos: «Mentalidade um pouco provinciana» de Lagoa é entrave ao seu crescimento

«Apesar de Lagoa ser cidade, continua, em diversas áreas, a ter uma mentalidade um pouco provinciana, e isso não deixa […]


«Apesar de Lagoa ser cidade, continua, em diversas áreas, a ter uma mentalidade um pouco provinciana, e isso não deixa de ser um entrave ao crescimento». A opinião é de Rui Pires Santos, diretor do jornal «Lagoa Informa».

Partindo dos dados estatísticos fornecidos pela Pordata e resumidos na infografia que publicamos acima, o Sul Informação pediu jornalista que fizesse um retrato do concelho de Lagoa, onde trabalha e reside.

Os números da Pordata não surpreendem Rui Pires Santos, que considera estarem «em linha com o que tem sido o histórico do concelho». Os dados, acrescenta, «revelam uma estabilidade nos vários parâmetros, embora evidenciem um aumento da população idosa, o que é transversal à região e a todo o país».

Por outro lado, as estatísticas «mostram o considerável número de residentes estrangeiros, num dado positivo para a dinâmica local, e confirmam uma autarquia com boa gestão, o que sempre foi uma imagem de marca de Lagoa».

Rui Santos considera mesmo que «o concelho de Lagoa é, porventura, um dos melhores do Algarve em termos de qualidade de vida. Pela beleza natural, a boa gastronomia, a segurança, as infraestruturas de qualidade para a prática de desporto, o património e as boas vias de comunicação. Ao longo do tempo, exceto nos anos de crise, – sensivelmente entre 2010 e 2014 – Lagoa cresceu e melhorou».

Mas nem tudo são rosas, no concelho. «Um serviço bom que Lagoa sempre teve, mas que perdeu nos últimos três anos, foi na área da saúde. Os Centros de Saúde em todo o concelho sempre funcionarem muito bem, com qualidade, boas condições e sem tempos de espera, ao contrário do que se registavam em alguns concelhos da região. Infelizmente, hoje estão todos nivelados por baixo», sublinha o jornalista.

Quanto à economia e à dinâmica empresarial, Rui Pires Santos defende que «é necessário existir maior empreendedorismo e uma visão mais global e moderna. Há exemplos de novos projetos, ainda que escassos. Há boas empresas, bons empresários, mas falta alguma inovação para um concelho que dispõe de inúmeras potencialidades».

É que, salienta, e chamando a atenção para um problema que é transversal a todo o Algarve, «a nível económico, falta uma aposta global noutros setores que não apenas o turismo. Há que marcar a diferença relativamente aos restantes concelhos e não ir só pela via mais fácil, que é o turismo, área que neste momento está em alta. É preciso, desde já, incentivar e promover a criação de empresas em setores como a agricultura ou indústria, de forma a que o emprego no concelho não dependa em demasia do turismo».

Para isso, «seria útil pensar e preparar uma estratégia conjunta, envolvendo alguns empresários com solidez financeira, para o investimento noutros setores. Isto seria pensar o futuro e precaver a economia do concelho para um eventual fim de ciclo deste ‘boom’ turístico registado nos últimos dois anos».

O diretor do jornal quinzenário «Lagoa Informa» considera que falta no concelho «uma associação de empresários locais, verdadeiramente interessados, não focados apenas no lucro repentino, que discutisse esta questão e pensasse alargar as suas áreas de negócio, com uma visão a 10 ou 20 anos».

E depois…«há ainda a questão das mentalidades», a tal «mentalidade um pouco provinciana» que continua a caracterizar Lagoa. «Como consequência desta mentalidade, há poucas parcerias e sinergias, que poderiam ser o motor para uma maior dinâmica empresarial».

«É preciso que as novas gerações surjam com mais força e vontade de fazer diferente. Fazer igual ao que já existe ou mais do mesmo, só porque ali ao lado resultou, não pode ser opção. É preciso investir em áreas de negócio onde o concelho ainda não é forte ou atividades económicas com potencial, mas que ainda estão por explorar», repete.

Outra lacuna que o jornalista encontra no concelho tem a ver com os espaços verdes e de lazer. «Falta a Lagoa, e a quase todos os concelhos do Algarve, um espaço verde, um jardim digno desse nome, como vemos em cidades como Viseu, Coimbra ou Leiria, só para dar alguns exemplos».

Rui Pires Santos considera mesmo que «essa é uma pecha do concelho: a falta de um espaço verde de dimensão digna e não um pequeno conjunto de árvores de médio porte e bancos de jardim, como vemos um pouco por todo Algarve. Lagoa marcaria a diferença na região se contasse com um mini Jardim da Estrela ou do atual Campo Grande, em Lisboa, com árvores de grande porte, lago, esplanadas, zonas de estar, de lazer e sombras».

Quanto à dinâmica associativa, que, em tantos municípios, acaba por complementar a ação das entidades oficiais como a Câmara, em Lagoa, Rui Pires Santos diz que «há uma assinalável dinâmica das associações, ainda que a mesma seja muitas vezes marcada pela tal mentalidade que referi antes. É preciso estruturar, pensar e não repetir o que outros já fazem».

De qualquer modo, «as coletividades têm peso e desempenham um papel importante na comunidade para manter a identidade e a tradição. Contudo, também elas precisam de, gradualmente, inovar e renovar-se».

Feitas as contas, analisados os dados da Pordata e tendo em conta a sua própria experiência, o jornalista conclui: «Lagoa é um concelho tranquilo, organizado e seguro. Julgo que tem o essencial que um cidadão normal precisa para ter uma vida agradável».

 

NOTA: Sul Informação está a publicar uma série de 16 artigos denominada «Raio-X dos Concelhos», dedicados a cada um dos 16 municípios algarvios.
As infografias, desenvolvidas pelo nosso jornalista multimédia Nuno Costa, usam dados estatísticos da Pordata.
As pessoas escolhidas para comentar os dados em cada um dos concelhos não estão, tanto quanto possível, ligadas a partidos políticos e residem, têm negócios, trabalham ou nasceram nos municípios em causa.

 

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