Igreja de Nossa Senhora das Ondas devolvida aos mareantes de Tavira após restauro

As mil e tal tábuas do teto em madeira pintada, os retábulos, os altares, tudo foi retirado da Igreja de […]

Igreja de Nossa Senhora das Ondas_01As mil e tal tábuas do teto em madeira pintada, os retábulos, os altares, tudo foi retirado da Igreja de Nossa Senhora das Ondas, para ser restaurado com o máximo dos cuidados na Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, num trabalho que demorou dois anos, de 2012 a 2014.

Depois de recuperado o próprio edifício, estas verdadeiras, e às vezes desconcertantes, obras de arte voltaram ao seu sítio original.

Na semana passada, a Igreja oficialmente dedicada a São Pedro Gonçalves Telmo, padroeiro dos mareantes de Tavira, foi devolvida ao culto, depois de uma missa de bênção, presidida pelo Bispo do Algarve, D. Manuel Neto Quintas.

Na cerimónia, Jorge Botelho, presidente da Câmara de Tavira, recordou que, antes desta profunda intervenção, o templo esteve fechado durante anos, devido à acentuada degradação. Mas «uma igreja que tem grande valor histórico, sobretudo por estar tão ligada à comunidade piscatória, não merecia ter um enorme buraco no telhado, que foi o que encontrámos».

«Como neto de uma família de pescadores, tenho um grande gosto em ver esta igreja de novo aberta», salientou o autarca.

No total, a intervenção nesta igreja classificada como Monumento de Interesse Público custou perto de 430 mil euros. Os trabalhos foram executados na cobertura e tetos, revestimento de paredes interiores e exteriores, guarnecimento de vãos, cantarias, património integrado, instalações elétricas, bem como, numa segunda fase, no coro alto, arco da capela-mor e na estrutura que suportava o teto da nave da igreja. O investimento foi financiado no âmbito do PO Algarve21.

O resultado é espetacular. Até o Bispo do Algarve, que admitiu não ter conhecido a igreja antes das obras, elogiou a beleza e qualidade do trabalho.

Edifício do Compromisso Marítimo e Igreja de Nossa Senhora das Ondas
Edifício do Compromisso Marítimo e Igreja de Nossa Senhora das Ondas

A igreja foi propriedade da Segurança Social, que herdou os bens das antigas Casas dos Pescadores, por sua vez, no caso de Tavira, herdeira da Confraria de São Pedro Gonçalves Telmo, formada por pescadores e mareantes. Por essa razão, era também conhecida como Igreja do Compromisso Marítimo.

Ainda no mandato de Macário Correia na Câmara de Tavira, estava Botelho à frente da Segurança Social no Algarve, esta entidade fez um contrato de comodato com a autarquia, que passou a ser a responsável pelo edifício, permitindo-lhe assim liderar o processo de restauro do edifício e do seu belo interior.

O presidente da Câmara anunciou ainda que está «neste momento a concurso» a reabilitação do vizinho edifício do Compromisso Marítimo, onde funcionaram, até há pouco tempo, serviços da Segurança Social. «Qualquer dia todo este edifício, da igreja e do Compromisso, estarão recuperados», garantiu.

Mas, sendo Tavira conhecida como a «Roma do Algarve», pelo facto de ter largas dezenas de igrejas, a Câmara está também a intervir na Ermida de São Roque, junto aos Bombeiros Municipais, lembrou Botelho.

Aqui trata-se de um investimento de cerca de 224 mil euros, que passa por obras na cobertura, paredes e vãos, bem como pela recuperação estrutural e exterior do edifício.

Além disso, já antes o município tinha promovido o restauro das pinturas da Igreja do Carmo.

«Tavira é a cidade das igrejas, mas queremos que sejam igrejas abertas, à espera dos visitantes, a atrair os turistas. No Verão, teremos 12 igrejas abertas, mas também queremos que isso aconteça no resto do ano».

 

Quatro marítimos homenageados no Dia do Pescador

Os pescadores homenageados, com o Bispo do Algarve
Os pescadores homenageados, com o Bispo do Algarve

A reabertura e bênção da Igreja de Nossa Senhora das Ondas, de São Pedro Gonçalves Telmo ou dos Mareantes teve lugar no Dia do Pescador. Por isso, três representantes da comunidade piscatória ofereceram à igreja símbolos da sua atividade – uma murejona, um alcatruz e um covo.

Depois de descerrada uma lápide na fachada do templo, lá dentro prosseguiu a cerimónia de homenagem a  quatro marítimos, como forma de reconhecimento e valorização pela sua dedicação ao mar.

São eles José João da Conceição Romão (Cabanas), de 68 anos, que era conhecido como «Capitão Tormenta» e ainda hoje vai à pesca, João da Cruz Sebinho Romeira (Santa Luzia), que, em criança, preferia a pesca à escola, escondendo-se na proa do barco para o pai só o descobrir quando já estavam em alto mar, José Daniel de Sousa Cabrita (Tavira), o mais novo de todos, com 56 anos, e ainda Francisco do Carmo Marcelino, de 78 anos.

Além deles, foi também homenageado Leonardo Diogo, presidente da Associação de Pescadores e Armadores de Tavira, que, no seu discurso, falou dos projetos implementados no âmbito do Promar, nomeadamente o guincho e o carro-berço instalados na rampa da margem esquerda do Gilão.

Leonardo Diogo lamentou a falta de «dragagem da barra e dos canais de acesso às comunidades piscatórias de Santa Luzia, Cabanas e Tavira», bem como salientou que «o porto de pesca para Tavira não está esquecido».

Em resposta, Jorge Botelho disse que «não abandonámos o projeto do porto de pesca», mas que, enquanto ele não avança, «estamos a trabalhar com a Docapesca para melhorar as condições de trabalho dos pescadores».

O autarca anunciou ainda que «as dragagens, esperadas há mais de 15 anos, vão começar a 9 de Junho, pelo canal de Cabanas, seguindo depois para Santa Luzia e finalmente para a zona de manobra das Quatro Águas».

«Estas obras são mais do que necessárias. Se não dermos condições, qualquer dia não há nenhum jovem que queira ser pescador», avisou o presidente da Câmara de Tavira.

 

Um pouco de história da Igreja das Ondas

Igreja das Ondas
Imagem de São Pedro Gonçalves Telmo, no altar mor

A Igreja de Nossa Senhora das Ondas, em Tavira, mandada edificar na primeira metade do século XVI pela Confraria de São Pedro Gonçalves Telmo (também conhecida como Compromisso Marítimo), é um edifício que reúne em si mesmo memórias de grande importância para a História Religiosa e Local, já que é um testemunho vivo da atividade marítima em Tavira, e do grupo social que lhe esteve subjacente – a confraria de pescadores e mareantes, cujo patrono era S. Pedro Gonçalves Telmo.

Numa perspetiva estética, e no plano formal, o templo inscreve-se no estilo arquitetónico do primeiro Renascimento, evidenciado nalguns elementos (pórtico principal, arco triunfal e retábulo da capela-mor), o que testemunha o importante papel desempenhado pelos artistas que então laboravam na cidade de Tavira e que contribuíram para fixar o papel que esta cidade teve enquanto centro de uma escola regional de arquitetura renascentista de grande atividade.

Os danos causados pelo sismo de 1755 determinaram a reconstrução do templo, confiada à responsabilidade de Diogo Tavares de Ataíde, o mais importante mestre pedreiro da época barroca do Algarve.

Na decoração interior da Igreja de Nossa Senhora das Ondas, merece especial destaque a pintura em perspetiva que decora o teto, considerado como o mais antigo teto pintado nesta técnica em toda a região algarvia.

A restante decoração é composta quase exclusivamente por peças do barroco setecentista, sendo de realçar, além do já referido teto, a talha – cinco retábulos – , a pintura sobre tela – que integra os retábulos e que é de grande qualidade – e a escultura – cinco exemplares em madeira, um deles representando Nossa Senhora das Ondas.

Destaque-se ainda um órgão datado de finais do século XVIII.

Todo este conjunto concorria para concretizar o conceito de Arte Total veiculado no período barroco.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues/Sul Informação

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