«Portugal Pós-Troika»: país não se pode permitir deixar arrastar as grandes questões de fundo

Portugal «pela sua debilidade económico-financeira, não se pode permitir deixar arrastar as grandes questões de fundo», defende Vítor Neto, presidente […]

livro jack soifer_1Portugal «pela sua debilidade económico-financeira, não se pode permitir deixar arrastar as grandes questões de fundo», defende Vítor Neto, presidente da Associação Empresarial da Região do Algarve (NERA) e vice-presidente da AIP (Associação Industrial Portuguesa).

Estas declarações do empresário e dirigente associativo foram feitas durante o lançamento, na sede do NERA, em Loulé, do livro bilingue «Portugal Pós-Troika», de oito autores de quatro países, coordenado pelo consultor Jack Soifer.

«Este livro é um instrumento interessante de reflexão, que pode contribuir para um balanço do que se passou nos últimos anos, da nossa presença na União Europeia, e para encontrar respostas adequadas aos desafios que aí temos», acrescentou Vítor Neto.

Jack Soifer, que é um dos autores e coordena a obra «Portugal Pós-Troika», disse ao Sul Informação que, depois de já ter escrito uma série de livros sobre os problemas da crise, «cheguei à conclusão de que a minha visão era muito voltada apenas para a parte económica», nomeadamente «quais são as alternativas em termos de criar possibilidades de exportação em diferentes nichos». «Senti que faltavam outros aspetos, nomeadamente o social. E eu não tenho competência nisso. Por isso, convidei Viriato Seromenho Marques, Henrique Neto».

«Depois achei que era preciso trazer autores estrangeiros, para darem uma visão europeia daquilo que está a acontecer com o euro e com Portugal. Cada um trabalha num nicho diferente, são especializados em coisas diferentes, e todos têm esta visão de que Portugal precisa de, pelo menos uma outra alternativa, a isto que a Troika nos está a impor», sublinhou.

 

Jack Soifer: achei que era preciso trazer autores estrangeiros, para darem uma visão europeia daquilo que está a acontecer com o euro e com Portugal

 

«Portugal Pós-Troika» tem oito autores, de quatro países: Armindo J. Palma, engenheiro agrónomo, presidente da Câmara de Idanha-a-Nova, Francisco Bívar Weinholtz, advogado, Henrique Neto, empresário e ex-vice presidente da AIP Henrique Neto, Jack Soifer, consultor de negócios internacional, sueco-brasileiro, John Wolf, autor e tradutor, norte-americano residente em Portugal, Luís C. Silva, engenheiro de transportes, ex-diretor da REFER, Stefan de Vylder, economista, ex-professor da Universidade de Estocolmo, ex-diretor da Swedish International Development Agency, e ainda Viriato Soromenho-Marques, professor universitário, ex-presidente da Quercus e antigo diretor do Programa Ambiental da Fundação Gulbenkian.

«Eu conhecia os outros sete autores, mas eles não se conheciam entre eles», explica Jack Soifer. «As suas reflexões, sem ter havido troca de ideias entre eles, as razões dos problemas que eles concluíram, são muito parecidas e todos eles dizem que a Troika atacou os efeitos e não as causas do problema. E todos dizem que o caminho iniciado pela Troika não funcionou noutros países e não vai funcionar em Portugal. Todos eles estão a propor praticamente a mesma coisa, que é uma renegociação da dívida – não é não pagar, mas sim prolongar o prazo», acrescenta o consultor.

No seu artigo, um dos oito que integram o livro, Soifer propõe, «por exemplo, que parte da dívida seja trocada por crédito. Por exemplo: se o BPI tem uma dívida ao Deutsche Bank (DB), o BPI diz ao Deutsche Bank: aqui tem os 1000 milhões que eu vos devo, que é um crédito para repassarem às empresas alemãs ou outras, clientes do DB, para comprarem produtos em Portugal. O DB pode chegar à Volkswagen e dizer: aqui estão 500 milhões para vocês comprarem produtos em Portugal. A VW repassa esses 500 milhões para a AutoEuropa, que, por exemplo, contrata a compra de autopeças, de fornecimentos diretamente para a Alemanha. Isto faz com que VW, em vez de importar produtos da Ásia, como hoje faz, passa a importar produtos de Portugal. Com um aumento das exportações, nós teremos mais empregos, a economia a rodar, um aumento do PIB e mais facilidade em pagar a dívida».

livro jack soifer_2Jack Soifer sublinhou, na sua entrevista ao Sul Informação: «proponho um sistema que já foi utilizado para outros países. O problema é que, em Portugal, ninguém está interessado em olhar para as rodas que já rodam e funcionam em outros países», estão sempre a querer «inventar a roda».

Mas então, se há tanta gente a dizer que é preciso renegociar a dívida, porque é que se insiste? «É um problema puramente político. A maioria dos atuais políticos sabem que, quando acabar o seu período, terão de arranjar emprego noutro sítio, porque aqui não há. Então eles estão a fazer tudo para agradar aos homens de Bruxelas, de Frankfurt, e naturalmente de Nova Iorque, para que eles possam ser contratados». «Como aconteceu recentemente em Portugal», acrescenta Soifer, aludindo ao caso do ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar, contratado pelo FMI.

Para Jack Soifer, «já não se resolve esta questão pedindo ao Governo alternativas. Agora tem que se exigir! De uma forma muito forte, tem que se exigir que se negoceie!» Para mais porque, na sua opinião, e na de alguns dos autores presentes no livro agora editado, «nunca houve negociação com a Troika. A Troika chegou e impôs uma série de normas, que não foram negociadas».

É a tal questão de Portugal querer ser o bom aluno da Europa. «Mas bom aluno para quê? Para ser um escravo, um servo? Ou um bom aluno que negoceia com o mestre e este reconhece no aluno competência para ter mais poder?», interroga o coordenador do livro.

 

Jack Soifer: a nossa elite não vai para a rua, fazer manifestações. Mas pode dar os instrumentos a outros, nomeadamente à comunicação social

 

Será que este livro «Portugal Pós-Troika» vai mudar alguma coisa? «Tenho a impressão que não. O que nós estamos é a dar um contributo para uma certa elite portuguesa, que já está a protestar. O que nós queremos é que seja mais um instrumento com dados muito concretos, com estatísticas reais, com o objetivo que outros façam alguma coisa. A nossa elite não vai para a rua, fazer manifestações. Mas pode dar os instrumentos a outros, nomeadamente à comunicação social». Para mais porque algumas das personalidades que assinaram o chamado Manifesto dos 74 são também autores presentes no livro «Portugal Pós-Troika», como Henrique Neto e Seromenho Marques.

Vítor Neto, que foi o anfitrião da apresentação do livro no NERA, salientou que a obra contem «vários contributos de diferentes pessoas, que têm opiniões que convém debater».

 

Vítor Neto: Há que «ter clareza nas medidas que se apresentaram para resolver os problemas e analisar os resultados dessas medidas e ver se foram adequadas

 

Há que «ter clareza nas medidas que se apresentaram para resolver os problemas e analisar os resultados dessas medidas e ver se foram adequadas. Se não foram adequadas, quais são então as medidas adequadas? Temos de ter coragem de enfrentar isso, porque, se não o fizermos, continuaremos a arrastar-nos pela não solução dos problemas», disse o presidente do NERA, em declarações ao Sul Informação.

Vítor Neto defendeu também a necessidade de «haver transparência, equidade e coragem. Transparência porque continuamos a ser surpreendidos todos os dias com situações inesperadas na área financeira e equidade porque houve sectores da nossa população que pagaram um preço e setores que não pagaram e até se aproveitaram da situação».

A sessão de apresentação do livro «Portugal Pós-Troika» contou com presença de outro dos autores, o advogado Francisco Bívar Weinholtz, bem como de Elda Alvarez, Cônsul-Geral adjunta do Brasil no Algarve, e de diversos empresários da região, alguns dos quais apresentaram a sua experiência no mundo dos negócios.

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