Médico do hospital de Portimão premiado por método inovador para tratar otite serosa nas crianças

Um método inovador a nível mundial, que permite evitar 80% das cirurgias invasivas nas crianças que sofrem de otite média […]

Um método inovador a nível mundial, que permite evitar 80% das cirurgias invasivas nas crianças que sofrem de otite média serosa, foi inventado e desenvolvido inteiramente no hospital de Portimão, pela equipa coordenada pelo médico Armin Bidarian Moniri, do Serviço de Otorrinolaringologia no Centro Hospitalar Algarvio (CHA).

O método é aparentemente muito simples e consta de uma máscara que se adapta ao nariz e à boca da criança, com um tubo, um balão que insufla de cada vez que o pequeno doente respira e ainda uma bomba. Tudo isso está escondido dentro de um brinquedo, um peluche, de modo a tornar o tratamento o menos «assustador e agressivo possível» para a criança…e até para os seus pais, como explicou Armin Bidarian Moniri ao Sul Informação.

A invenção e o desenvolvimento deste método valeu ao jovem médico Otorrinolaringologista uma distinção da Rainha Sílvia da Suécia, o seu país natal, que lhe foi entregue no passado dia 22 de Janeiro, no Castelo de Estocolmo, naquele país nórdico.

Esta distinção deve-se ao seu trabalho de investigação relacionado com a deficiência auditiva em crianças, que culminou com a criação de um tratamento inovador e não invasivo da otite média serosa, diminuindo, assim, as cirurgias invasivas.

A perda auditiva em crianças, cuja causa mais frequente é a otite serosa (cerca de 80% das crianças sofrem uma ou mais otites serosas antes dos 4 anos de idade), é uma deficiência comum que pode arrastar-se durante meses a anos antes de ser detetada, resultando em milhares de operações anuais em Portugal e em todo o mundo.

Além dos potenciais riscos associados à anestesia, as crianças sofrem ocasionalmente complicações graves e muitas têm que voltar a ser operadas. Todos estes procedimentos acarretam elevados custos socioeconómicos.

 

Método simples mas inovador

Foi para tentar evitar isso que Armin Bidarian Moniri desenvolveu um novo método não-invasivo para o tratamento da otite serosa, que consiste num dispositivo que, aparentando ser um brinquedo, ajuda a criança a equilibrar a pressão e arejar o ouvido médio, prevenindo a formação de otites serosas.
«Esta é uma doença relativamente comum. Todas as crianças até aos 4 anos vão ter um ou vários episódios de otite serosa», explicou o médico ao Sul Informação.

«O equipamento é baseado em dois métodos que já conhecemos há vários séculos. O problema tem sido adaptar esses métodos para poderem ser aplicados às crianças desta idade. As crianças que ficam com otite serosa normalmente estão entre 2 e 4 anos. Estas crianças pequenas têm dificuldade em usar os métodos existentes, dos quais o mais simples é o que os mergulhadores usam: fechar o nariz e empurrar o ar com força e sentir que dá um estalinho nos ouvidos».

«Este equipamento inclui uma máscara para tapar o nariz e a boca da criança, um tubo no meio, ligado a um balão e do outro lado uma bomba, tudo coberto por um peluche. O que é que acontece? As crianças gostam deste tratamento que não lhes parece nada de agressivo, podem respirar normalmente e não têm sensação de claustrofobia, mas, quando expiram, o balão enche e aumenta a pressão no sistema. O facto de ter este balão mostra à criança e aos pais que o tratamento está a ser feito da maneira correta e é o suficiente para ouvir o estalinho nos ouvidos», explica ainda o especialista.

 

Estudo começou em 2010

Os médicos Ilídio Gonçalves, diretor do Serviço de Otorrinolaringologia do CHA, e Armin Bidarian Moniri

O estudo que levou ao desenvolvimento do método inovador começou em 2010, no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital do Barlavento Algarvio, em Portimão.

Começou-se por um «primeiro estudo, mais limitado, sobre o desenvolvimento do método e para avaliar parâmetros». Nesse primeiro estudo, «participaram 20 crianças, que fizeram o tratamento, e ainda um grupo de controlo de 10 outras crianças, que não fizeram». Todas as crianças estavam referenciadas para cirurgia na lista de espera do Serviço. «Mostrámos que, no grupo de crianças que fez o tratamento, 83% evitaram a cirurgia».

A equipa avançou depois para um segundo estudo, que vai agora na revista “International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology”, que envolveu a participação de mais crianças, sendo «um estudo randomizado, controlado, com seguimento de 12 meses».

Destes estudos, a conclusão foi sempre a mesma – o método desenvolvido por Armin permitiu diminuir em 80% o número de crianças que necessitavam de cirurgia, diminuindo assim os potenciais riscos para os pequenos doentes, mas também custos para o hospital, a família e o Serviço Nacional de Saúde. «Todos ficam a ganhar, mas quem ganha mais é a saúde das crianças», diz Armin Moniri.

Este novo método foi testado no serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Portimão, hoje integrado no CHA, contando com a colaboração dos colegas Ilídio Gonçalves (diretor de serviço), Maria-João Ramos, Lourdes Moreno e Rubén Rojas.

Sem qualquer efeito colateral detetado e com uma excelente adesão, o método foi patenteado e será comercializado sob o nome de Moniri-Otovent, ainda este ano.

«A patente já está registada e o método deverá ser comercializado em princípio por uma empresa sueca. Por acaso, eles têm demorado muito tempo a reproduzir esta bonequinha que nós fizemos de forma caseira», conta o médico. «Se calhar temos de falar com uma empresa portuguesa para o produzir», aventa Ilídio Gonçalves, diretor do Serviço de Otorrinolaringologia do CHA, que também participou na conversa.

E quanto custará este equipamento? «Não sei ainda, mas não deverá ser muito caro», responde o seu inventor.

Apesar de a questão da saúde das crianças ter estado sempre em primeiro lugar no desenvolvimento deste método inovador na nível mundial, Armin Moniri salienta que ele «poupa dinheiro da cirurgia, poupa recursos médicos, poupa tempo de bloco».

Para avaliar o custo real, o seu Serviço vai agora «fazer um estudo, com a ajuda do Departamento de Economia do hospital, para comparar os custos de 70 doentes que foram operados com os 70 doentes que foram tratados com este método». E o jovem médico não tem dúvidas em afirmar que se trata de uma «diferença enorme».

 

Serviço é exemplar mas tem falta de médicos

Armin Bidarian Moniri (o segundo da direita) com a Rainha Sílivia da Suécia e outros galardoados

O novo método foi inteira e unicamente desenvolvido no hospital de Portimão, que tem aquele que é considerado um dos melhores Serviços de Otorrinolaringologia do país. De tal modo que, com a criação do Centro Hospitalar do Algarve, a direção do Serviço, que reúne as unidades de Portimão e de Faro, ficou na cidade barlaventina, sob a direção de Ilídio Gonçalves.

«Este Serviço tem carência de 50% das pessoas necessárias. Esperamos agora que este trabalho do Armin possa atrair profissionais para o Algarve, de forma a que se conseguir ter aqui um serviço polivalente e mais eficaz. Talvez a divulgação deste trabalho ajude as pessoas a perceber que aqui se faz um trabalho de muita qualidade, de investigação e há oportunidades de carreira», salientou Ilídio Gonçalves, em declarações ao Sul Informação.

Armin Bidarian Moniri, que é um sueco de ascendência persa e estudou na Noruega, afirma-se muito «orgulhoso» em trabalhar com a equipa que encontrou no hospital de Portimão.

«Em 2012 e 2013, cortámos a lista de espera em todas as áreas – na Consulta Externa, reduzimos para uma lista de espera de quatro semanas, na cirurgia de ambulatório a mesma coisa, também quatro semanas, e no Bloco Central para três meses. Também conseguimos dar apoio ao serviço de Urgência todos os dias, embora mais limitados em algumas horas. E fazemos ainda trabalho científico, além de darmos formação aos alunos de Medicina da Universidade do Algarve», onde, aliás, Armin é professor convidado.

«Temos uma lista de espera fabulosa e temos muito orgulho nisso. Não se encontra uma lista assim, nem em outros países da Europa, só no privado. Em serviços públicos nunca. Na Noruega, a lista de espera chega a ser de um ano», garante o médico.

Uma situação exemplar que se tornou um «pouco mais complicada» com a recente fusão dos dois serviços de Portimão e Faro, como explica Ilídio Gonçalves. É que «a Unidade de Faro tem apenas uma pessoa a tempo inteiro e outra a meio tempo, o que torna muito difícil a gestão do Serviço, porque estamos a trabalhar com pratos da balança completamente desequilibrados».

No total, o Serviço tem «cinco pessoas e meia, quatro em Portimão e um e meio em Faro. E deveria ter pelo menos 10 a 12 pessoas no mínimo», garante o diretor do Serviço de Otorrino do CHA.

Além do mais, tem sido difícil recrutar jovens médicos, ainda em formação, já que os hospitais de Faro ou de Portimão, por si só, não tinham internato, «porque não tínhamos as quotas que o Colégio da especialidade exige». No entanto, «com a fusão dos serviços talvez consigamos».

Apesar da escassez de recursos humanos, o Serviço de Otorrinolaringologia do CHA continua a dar cartas no que diz respeito ao seu trabalho e à investigação médica. O desenvolvimento do método que será comercializado a nível internacional com o nome de Moniri-Otovent colocará o nome dos hospitais algarvios nas bocas do mundo médico…e nos ouvidos das crianças.

 

Um sueco que se apaixonou por Portugal

O sueco Armin Bidarian Moniri tem 39 anos e é formado em Medicina na Universidade de Bergen, Noruega, contando já com uma brilhante carreira. Realizou trabalho clínico em anestesia e cirurgia pediátrica no Hospital Universitário Karolinska, em Estocolmo, e a especialidade de Otorrinolaringologia no Hospital Universitário Sahlgrenska, em Gotemburgo, ambos na Suécia, onde iniciou o doutoramento em “Apneia do Sono em adultos e otite seromucosa em crianças”, baseado em dois novos tratamentos por si imaginados.

Em 2009, Armin veio viver para Portugal, começando a trabalhar no Hospital do Barlavento Algarvio, em Portimão, sendo atualmente também professor convidado do curso de Medicina da Universidade do Algarve. E porquê Portugal? «Por amor!», responde, com entusiasmo.

«A minha mulher é portuguesa, é médica dentista, viveu comigo na Suécia alguns anos, mas depois quisemos mudar-nos para Portugal. Não conhecia nada de Portugal antes de vir para cá, mas fiquei muito satisfeito por ver uma cultura tão rica, tão aberta, com gente tão hospitaleira, com tanta qualidade em tantas áreas técnicas».

Armin, que nasceu na Suécia, mas já viveu e trabalhou também na Noruega, Espanha, França e Grécia, diz: «tenho muito para comparar e Portugal ganha!».

O médico faz questão de sublinhar: «tive a sorte de trabalhar com bons profissionais, neste serviço. E agora temos que aproveitar o bom trabalho que aqui temos feito para tentar recrutar mais pessoas para este serviço, de modo a fazer um serviço mais forte aqui no Sul».

 

 

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