Algo de terrivelmente mau se passa

Nos últimos meses, têm-se sucedido os relatos de casos de falta de medicamentos, de material médico e cirúrgico, ou de […]

Nos últimos meses, têm-se sucedido os relatos de casos de falta de medicamentos, de material médico e cirúrgico, ou de outros consumíveis hospitalares, alguns tão básicos como pensos rápidos para quem faz análises ao sangue ou almofadas para os doentes. Há mesmo situações relatadas de falta de medicamentos para doentes de cancro, ou de alimentação intravenosa e drogas para doentes críticos internados na Unidade de Cuidados Intensivos.

Mas têm faltado também fraldas descartáveis, material de sutura, agulhas, gaze, lençóis e roupas para os internados, etc, etc. A lista de denúncias é longa.

Esta semana, ficou a saber-se que, por falta de cateteres e stents no Hospital de Faro um doente de Monchique que sofreu um enfarte voltou para casa sem que um exame importante, um cateterismo, pudesse ser feito. Que voltasse depois, disseram-lhe.

A todas estas denúncias, o presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve tem respondido a dizer que «é mentira». E Pedro Nunes tem-se desdobrado, em resposta a a quem denuncia as situações, em críticas mais ou menos insultuosas, mais ou menos veladas, aos seus colegas médicos e ao restante pessoal dos hospitais algarvios que estão sob a sua tutela.

O administrador até pode ter razão quando diz que, antes, se gastava à tripa forra e que os médicos não olhavam a despesas, assim aumentando a dívida dos hospitais e do Serviço Nacional de Saúde.

Mas alguma coisa está a correr terrivelmente mal nos serviços de Saúde deste país quando coisas tão básicas como almofadas e pensos rápidos faltam.

O presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve costuma ainda dizer que as críticas que têm sido feitas à sua gestão são «más para o Algarve». Ainda ontem, em mais uma entrevista telefónica que lhe fiz, ele me dizia: «se eu fosse um reformado alemão que vai aqui comprar casa, ao ouvir estas notícias, pensava duas vezes».

Pelos vistos, este foi um argumento também aceite pelos presidentes de Câmara algarvios, como se soube após uma recente reunião da AMAL.

Mas a verdade é que, antes de se pensar nos turistas, há que pensar nas 400 mil pessoas que vivem o ano todo no Algarve e que precisam e merecem ter cuidados de saúde e hospitalares de qualidade.

Pedro Nunes gosta de apresentar-se como um David lutando contra o Golias. Neste caso, o Golias são, pelos vistos, todos os médicos, enfermeiros e restante pessoal dos hospitais, bem como os utentes, autarcas, cidadãos, que se atrevem a discordar da forma como ele aplica no Algarve as diretivas de cortes e contenção que recebe do Ministério da Saúde.

Tentar abafar os casos, tentar que não se fale deles, dizendo que se trata de campanhas ou invocando o superior interesse do Algarve faz-me lembrar outros tempos, que julgava acabados. Pelos vistos, há quem gostasse de poder voltar 40 anos atrás…

 

Este é o texto da crónica radiofónica que todas as quintas-feiras assino na Rádio Universitária do Algarve (RUA) e
que pode ser ouvida em podcast aqui.


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