Saúde Hospitalar Pública no Algarve: uma breve reflexão

Uma das mais profundas alterações à Lei de Bases da Saúde em Portugal dá-se em 2002, com a introdução da […]

Uma das mais profundas alterações à Lei de Bases da Saúde em Portugal dá-se em 2002, com a introdução da Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro. Em particular, esta Lei vem pela primeira vez permitir que os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) possam ser administrados com base nos princípios da gestão empresarial, com o intuito de promover a satisfação das necessidades dos utentes.

Há neste momento 33 Hospitais-empresa a operar em solo nacional, tendo a região Algarvia contado com duas unidades desta natureza até Junho de 2013.

De maior dimensão e mais diferenciado, o Hospital de Faro (HF) tem como missão a de “caracterizar-se como hos­pital central de referência no SNS e na região”, assumindo o “garante na segurança em saúde de todos os que habitam ou visitam a região do Algarve e a sua área de influência”.

Infelizmente, a concretização desta nobre missão afigura-se difícil, nomeadamente em função da situação económica e financeira do Hospital. Em particular, o relatório e contas de 2012 revela que o HF está tecnicamente falido (total do fundo patrimonial de -36 milhões de euros), apresenta um desequilíbrio económico grave (EBITDA de cerca de -2 milhões de euros e resultado líquido a rondar os -5.5 milhões de euros) e enfrenta um grave problema de tesouraria (a liquidez geral não ultrapassa os 5%, a liquidez imediata é nula e o prazo médio de pagamentos excede os 300 dias).

Ainda assim, a performance económica do HF até melhorou em termos homólogos.

Considerações contabilísticas à parte (ver a este propósito o documento relativo à certificação de contas), em 2012 dá-se uma redução no EBITDA na ordem dos 84% face ao valor apurado em 2011, muito por força de poupanças consideráveis nas rubricas de Custo das Matérias de Consumo (9 milhões de euros), Fornecimentos e Serviços Externos (3.6 milhões de euros) e Remunerações Base de Pessoal (2.2 milhões de euros).

Será então possível depreender que estamos a caminhar no sentido da sustentabilidade no que toca ao sector hospitalar público Algarvio?

Infelizmente, não. De facto, o capítulo 5 do relatório e contas mostra que há uma considerável redução da produção do HF em 2012.

Em particular, o número de cirurgias (programadas, urgentes ou adicionais) diminuiu 12.67% face a 2011, o que equivale a uma perda de 1,062 intervenções. A atividade de ambulatório também sofreu uma importante quebra em termos homólogos, com perdas de 35.71% na vertente cirúrgica, 10.71% em número de consultas e 11.51% em número de primeiras consultas.

Realizaram-se menos 22,663 consultas externas (ou 10.91% do total de 2011), tendo o hospital de dia reduzido a sua atividade em 4,819 sessões (ou seja, perdeu 20.49% da sua atividade em termos homólogos).

Finalmente é de registar uma quebra de 18,747 atendimentos de urgência face a 2011, o que equivale a uma redução de 12.49% nesta importante área de atuação do HF.

Estes números espelham uma dura realidade e remetem para uma conclusão preocupante: a melhoria da performance económica do HF em 2012 fez-se à custa de uma significativa redução da oferta pública de cuidados de saúde hospitalares no Algarve.

Em junho de 2013 foi criado o Centro Hospitalar do Algarve, EPE através da fusão do HF com o Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio. É ainda cedo para perceber o impacto desta operação na capacidade da região para produzir bens de saúde de qualidade a um custo socialmente comportável.

Como economista, contribuinte e residente no Algarve, espero que esta nova unidade venha efetivamente a ser administrada com base nos princípios da gestão empresarial, pois só assim se poderá finalmente cumprir o desiderato da promoção da satisfação das necessidades dos utentes, predicado fundamental da Lei n.º 27/2002 de 8 de Novembro.

 

Autor: Luís Coelho
Membro Efetivo da Ordem dos Economistas
Membro da Comissão Instaladora da Delegação do Algarve da Ordem dos Economistas
Professor Auxiliar de Finanças na Faculdade de Economia da Universidade do Algarve

 

Nota: Artigo publicado ao abrigo do protocolo entre o Sul Informação e a Delegação do Algarve da Ordem dos Economistas

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