«Mais dia, menos dia, o Museu da Cortiça tem que ser reaberto» (com fotos)

«É uma pena que este museu esteja fechado. Mas ainda bem que os jovens da terra se preocupam» disseram Olof […]

«É uma pena que este museu esteja fechado. Mas ainda bem que os jovens da terra se preocupam» disseram Olof e Hannah, um casal de turistas dinamarqueses que esta manhã teve a oportunidade de fazer o que há três anos ninguém faz: visitar o Museu da Cortiça, em Silves.

Os dois turistas septuagenários entraram quase a medo no recinto da Fábrica do Inglês, onde os 14 alunos da turma do 6ºF da Escola EB 2,3 Dr. Garcia Domingues, acompanhados por dois professores – Manuel Ramos e Anabela Marques – e por outras pessoas da terra, se dedicavam com afinco a arrancar as ervas que, após três anos de fecho do Museu, atingiam já mais de metro e meio de altura.

«Este Museu da Cortiça está aqui indicado no nosso guia», disseram Olof e Hannah à repórter do Sul Informação, apontando a fotografia no livro. «Mas não sabíamos que estava fechado. É uma pena». O casal de turistas dinamarqueses, eles próprios professores reformados, fez questão de visitar demoradamente o museu, que apenas abriu esta sexta-feira, de forma simbólica, por ser 18 de maio, Dia Internacional dos Museus, e, ironicamente, dia do terceiro aniversário do seu fecho.

Como Olof e Hannah, muitas pessoas aproveitaram as portas abertas para entrar no Museu da Cortiça, fechado em 2009, na sequência dos problemas financeiros da empresa proprietária da Fábrica do Inglês.

Um destes visitantes foi Diamantino Neves, que depois de ter sido operário corticeiro desde os 13 anos de idade, trabalhou no próprio museu, a exemplificar como funcionavam as máquinas de fazer rolhas. «Tanto que eu trabalhei aqui…Olha, está ali o meu nome», comentava o antigo operário apontando um painel à entrada do museu.

«Trabalhei numa fábrica aqui ao lado. Só vim para aqui quando criaram o museu. Isto metia aqui milhares de pessoas por ano. Agora está fechado…As guias turísticas, que me conhecem bem, estão sempre a perguntar-me quando me encontram: então quando é que o Museu da Cortiça reabre? Mas não vejo jeito disso acontecer…», disse Diamantino Neves, ao Sul Informação.

Os jovens alunos da turma do 6º F da escola de Silves, entre os 12 e os 15 anos, depressa conseguiram limpar de ervas a entrada do museu. Depois limparam o pó no interior e finalmente ainda ajudaram a apanhar laranjas nas árvores do jardim da Fábrica do Inglês, que foram doadas à Santa Casa da Misericórdia.

E o que pensam os jovens do estado do seu património? «É muito mau isto estar fechado», disse Rafael, de 12 anos, parco em palavras. Quanto ao trabalho de arrancar as ervas, de sacho na mão, Rafa estava como peixe na água: «costumo ajudar o meu avô lá na horta».

De vez em quando, Manuel Castelo Ramos, que ainda é diretor do Museu da Cortiça e é também professor de Estudo do Meio destes jovens, tinha que controlar os seus ímpetos. «Cuidado com o grés!», avisava Manuel Ramos quando alguém batia com mais força com a ferramenta nas pedras vermelhas do chão.

 

Documentarista francesa registou ação simbólica

 

Toda a azáfama, desde a preparação na escola, o desfile pelas ruas de Silves distribuindo postais do Museu, empunhando cartazes com palavras de ordem sobre a defesa deste património, o trabalho de limpeza e a apanha das laranjas, foi acompanhada não só por jornalistas, como pela documentarista luso-francesa Sónia Cabrita.

Nascida em Paris, mas filha de pai silvense, Sónia Cabrita está há um ano em Portugal a fazer um documentário sobre a memória da indústria conserveira em Silves. Deste seu trabalho, que passa por pesquisa em arquivos, entrevistas com antigos operários e com outras pessoas, a investigadora e documentarista até ficou com a ideia de que «Silves valoriza muito a sua história. Mas não no seu todo». Ou seja, «há zonas da história de Silves que estão bem iluminadas, como a herança dos mouros, e outras zonas que estão na sombra, como a importância da indústria corticeira. O estado em que está o Museu da Cortiça é bem exemplo disso».

Depois de mais uma «jornada de luta» bem sucedida, o que se vai agora seguir? O que resulta de tudo isto?

«Os alunos hoje aprenderam qualquer coisa aqui, pelo menos que o património da terra é importante e até traz cá os jornalistas», ironizou Manuel Ramos.

O professor e diretor do museu anunciou que em breve vai ser criada uma Associação de Amigos do Museu da Cortiça, estrutura que espera que venha a contar com o «apoio dos silvenses e de todos quantos queiram associar-se».

«Nós queremos que o processo de insolvência em que a Fábrica do Inglês está não impeça a reabertura deste Museu e, sobretudo, que não leve à dispersão deste património. Até porque muito do que está aqui pertencia de facto à Fábrica do Inglês, mas também houve muitas doações de pessoas de Silves».

«O futuro do museu também terá de ser o que as pessoas, os silvenses, quiserem que seja. Mas para isso é preciso que, seguindo o exemplo destes jovens estudantes, as pessoas se envolvam. Mais dia, menos dia este museu terá de ser reaberto», afirmou, esperançado, Manuel Ramos.

 

 

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